“No ano passado, eu ganhei duas calças no Natal. Uma de uma tia e a outra da minha esposa. Agora descobri que uma delas faz parte dessa polêmica história do tecido de hospital”, conta com bom humor.
Outra parte interessante dessa história foi a forma como ele descobriu. “Quando esse assunto estourou, um amigo brincou comigo: ‘aposto que você deve usar calça com tecido de hospital’. Foi tudo uma brincadeira que despertou minha curiosidade e olhei cada uma e foi aí que descobri”, conta.
Apesar de encarar a situação com naturalidade e bom humor, o cidadão guanhanense demonstra também sua insatisfação. “Não podem fazer isso com o consumidor. Se estamos adquirindo um produto, precisamos confiar na marca que estamos comprando. Se veio calça, deve vim outras coisas também”, desabafa.
A produção da Folha FM encontrou endereço e telefone da fábrica que fica na cidade de Toritama, no Pernambuco. A mulher que se identifica como proprietária é Edvalda Maria Gonçalves que afirma não utilizar tecidos de hospital em suas confecções. “Meu tecido é comprado em Pernambuco mesmo, de pessoas bem conceituadas. Se isso aconteceu, falsificaram minha marca”, afirma a empresária.
Edvalda Maria disse que a fábrica existe há aproximadamente oito anos e vende as confecções em uma feira de Pernambuco, onde compradores de vários estados vão buscar para revender ou distribuir entre outros lojistas.
Ao conversar com a proprietária, ela revelou que outro consumidor já entrou em contato fazendo a mesma reclamação, mas ainda assim, alega que não utiliza dos tecidos. “Alguém deve estar clonando minha marca, porque eu nunca comprei esse forro de bolso com nome de hospital. O rapaz que ligou não informou de onde era, mas um vendedor meu veio e disse que um rapaz que compra as peças, comentou que os forros eram de hospital”.
A suspeita do guanhanense é exatamente sobre o forro dos bolsos da calça, que tem o nome CaroMont Health. Ao pesquisar o nome, a produção desta reportagem descobriu o site da instituição americana, localizada na cidade de Gastonia, no estado North Caroline e possui 3.800 funcionários, faz seguro saúde e tem convênio com cem hospitais. O trabalho, aparentemente, é filantrópico.
A investigação sobre o uso de tecidos hospitalares na confecção de novas roupas foi muito intensa em Pernambuco e segundo Edvalda Maria, o fornecedor dos forros para sua fábrica também foi visitado pela Vigilância Sanitária. “Já foram lá também e não encontraram nada”, disse.
No dia 20 de outubro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) advertiu que resíduos provenientes de serviços de saúde de origem internacional, com entrada ilegal ou clandestina no país, não podem ser reutilizados no Brasil. A agência divulgou nota técnica para esclarecer os procedimentos que devem ser adotados em relação a reciclagem, reaproveitamento ou descarte de tecidos usados por hospitais.
Segundo a Agencia Brasil, em duas semanas no mês de outubro, até a comunicação dessa advertência, mais de 46 toneladas de lençóis, fronhas, toalhas de banho, batas, pijamas e roupas de bebês foram encontrados em contêineres apreendidos em Pernambuco.
De acordo com a Anvisa, o descarte de resíduos hospitalares é regulamentado desde 2004. As unidades de Saúde que não cumprirem a norma estão cometendo infração sanitária e estão sujeitas a penalidades e podem pagar multas de até R$ 1,5 milhão.
No caso específico de lençóis, a Anvisa orienta os hospitais a higienizar os produtos. Segundo a agência, quando devidamente processados, lençóis usados em hospitais não representam risco para a saúde da população.
“Os tecidos submetidos a tratamento na unidade de processamento de roupas dos serviços de saúde, quando perderem a funcionalidade original, podem sofrer reciclagem ou ser reaproveitados. Caso sejam descartados, estes resíduos são classificados como resíduos do grupo D e devem seguir as orientações dos serviços de limpeza urbana”, diz a nota da Anvisa.
Por Samira Cunha
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