Com 20 minutos de entrevista, a delegada Iara Franca interrompe a ligação para atender mais uma vítima de violência. Trata-se de uma menina de 11 anos que foi agredida, xingada e quase enforcada pela madrasta com um cabo de vassoura.
O caso foi registrado na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), em Belo Horizonte, e, na mesma hora, ao menos mais três denúncias como essa foram contabilizadas em Minas.
Dados da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) mostram que, de janeiro a junho deste ano, 20.456 crianças e adolescentes sofreram violência no Estado, seja física, sexual ou psicológica, uma média de 113 por dia. Isso significa que, a cada hora, ao menos quatro meninos e meninas são agredidos.
Segundo a Polícia Civil, foram 310 homicídios nessa faixa etária de janeiro a julho – uma média de quase dois por dia. A estimativa é que esses números sejam bem maiores considerando os casos que não são registrados na polícia por medo ou pela dificuldade em denunciar.
“Infelizmente, a subnotificação é grande. São situações que acontecem, em sua maioria, dentro de casa e em todas as classes sociais”, afirma o promotor de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, Celso Penna Fernandes Júnior.
A delegada Iara França diz, entretanto, que a incidência é maior em classes menos favorecidas, onde o mau comportamento da criança, muitas vezes, é resolvido sem diálogo, por meio da força física.
Em algumas situações, a violência chega ao ponto da tortura. “É aquela violência constante e desmotivada, para mostrar para a criança que o adulto exerce poder sobre ela”, explica Iara.
Das 20.456 ocorrências registradas por dia em Minas, a maioria (10.637) é de violência física, seguida da psicológica/moral (7.123) e da sexual (2.696). Os dados apresentam ligeira redução em relação aos índices de 2015 (veja abaixo).
Violência contínua
Antes da situação chegar às autoridades, a criança ou o adolescente costuma passar dias ou até anos sofrendo a agressão. “Percebemos que tem crescido o número de meninos vítimas de violência. Mas ainda há um tabu grande em denunciar, principalmente no caso de violência sexual. A criança fica fechada, acha que tem culpa no fato”, relata Iara.
A falta de estrutura dos conselhos tutelares e de um centro especializado de atendimento às vítimas que concentre todos os órgãos como Justiça, polícia, Ministério Público e Defensoria, também dificulta a denúncia.
Por O Tempo